Outras autoridades dentro do espiritismo enxergam a questão de forma diferente. “Um das coisas mais importantes é encorajar o paciente à cura. Isso porque, na realidade, trata-se sempre de uma auto-cura. É o próprio paciente quem restaura as células de seus envoltórios físico e espiritual”, afirma Marlene Nobre, presidente da Associação Médico-Espírita do Brasil. “Nesse sentido, cremos que a auto-sugestão é uma predisposição necessária.”
A afirmação da médica remete a um questionamento freqüentemente levantado quando se fala das cirurgias espirituais. Será que as supostas curas seriam fruto realmente do trabalho das entidades? Ou decorriam apenas de uma espécie de efeito placebo, em que os pacientes ficariam melhores justamente por acreditaram que isso aconteceria? Para o pesquisador norte-americano Harold G. Koenig, coordenador do Centro para Espiritualidade, Teologia e Saúde, da Duke University Medical Center, na Carolina do Norte (EUA), mesmo se existisse uma resposta definitiva para essa questão – o que ainda não há –, ela certamente não invalidaria o papel da crença no processo de recuperação da saúde. “A fé é um fator importante na cura, mas eu não chamaria isso de efeito placebo. O placebo sugere que não há nenhum ingrediente ativo e o resultado seria devido apenas à mente”, diz Koenig. “Não se sabe ainda se há um elemento ativo na fé, mas posso dizer que ela tem efeitos poderosos em quase tudo que nós fazemos na medicina. Por exemplo, já descobrimos que ela pode ajudar as pessoas a reduzir o stress, que, por sua vez, comprovadamente traz danos para a função imunológica. Logo, ao menos em teoria, é possível que qualquer doença relacionada ao stress – como problemas no coração, hipertensão e suscetibilidade a infecções – possa ser influenciada positivamente por uma prática religiosa.”
Para além da fé, os espíritas têm seus conceitos próprios para explicar o funcionamento das cirurgias psíquicas. Eles se valem da noção de perispírito, ou corpo astral (veja matéria na página 9). “Quando o espírito de um médico trabalha através de um médium, ele não mexe no corpo físico da pessoa, mas no corpo perispiritual”, afirma Ari Ferreira, palestrante da Federação Espírita do Estado de São Paulo. As enfermidades no plano físico decorreriam, na verdade, de problemas com esse corpo sutil. Seria esta a razão porque as operações prescindem de instrumentos cirúrgicos ou quaisquer outros objetos cortantes. “Nas cirurgias espirituais, há uma transfusão de energias vitais – originadas do médium – e espirituais – que emanam das entidades – para o paciente”, afirma Marlene Nobre.
Para garantir a pureza dessa energia que transmitiriam aos pacientes e a economia de suas próprias forças – já que há um grande dispêndio de energia nesses encontros –, os médiuns seguem algumas precauções. Sexo, álcool, cigarro e carne vermelha são cortados pelo menos 72 horas antes das reuniões. Além disso, as intervenções são acompanhadas de orações e leituras, que procuram criar um ambiente harmônico, e todos os presentes usam roupas de cor branca.
Cura ou curandeirismo?
Apesar dos depoimentos relatando melhoras, as intervenções do além encontram forte resistência por boa parte da comunidade médica, para quem tudo não passa de picaretagem. E mesmo entre os espíritas a prática é vista com cuidado. “Este é um campo escorregadio, sujeito ao charlatanismo e a mistificações. As verdadeiras cirurgias espirituais são raríssimas,”, diz Marlene Nobre. “Conceituados colegas nossos já afirmaram que encontraram infecções decorrentes das operações mediúnicas em pacientes que se submeteram a elas. Na década de 1980, por exemplo, a própria Associação Médico-Espírita denunciou casos de seqüelas provocadas por supostas cirurgias espirituais, que nem de longe apresentaram os resultados apregoados pelo médium.”
Para a médica espírita, o primeiro termômetro para se prevenir contra os picaretas é a gratuidade do tratamento. Esse cuidado é reforçado pelos profissionais da saúde “deste mundo”. “Tenho sérias resistências à chamada cirurgia espiritual com corte. É um campo em que podem surgir muitos charlatões, que querem se aproveitar do momento de fragilidade da pessoa para tirar dinheiro dela – por isso acredito que não pode haver remuneração”, afirma o cardiologista Roberto Luiz D’Ávila, diretor do Conselho Federal de Medicina.
Em 1987, o assunto atraiu a atenção do pesquisador e cético canadense James Randi, que se propôs a pesquisar a veracidade das supostas curas. Para isso, entrevistou 104 pessoas que se diziam curadas pelos médicos do espaço. A conclusão de Randi, que está no livro The Faith Healers (Os Curadores da Fé, inédito no Brasil), foi que seus entrevistados dividiam-se em três grupos. No primeiro, estavam os hipocondríacos, que na realidade não tinham doença nenhuma. No segundo, pessoas que estavam enfermas, mas continuaram doentes após o procedimento. E por fim, o terceiro grupo, do qual ele afirma não ter encontrado ninguém, era constituído por pessoas que já haviam morrido dos problemas que as afligiam. “Não posso afirmar que essas curas não funcionam, mas em todos os casos que investiguei, houve 100% de falha”, disse Randi.
No Brasil, o psiquiatra Alexandre Moreira de Almeida, do Departamento de Patologia da Universidade Federal de Medicina de Juiz de Fora (MG), realizou uma pesquisa junto ao médium João Teixeira de Faria. Trinta pacientes foram examinados antes e depois das cirurgias espirituais realizadas por ele, e o material retirado de seus corpos foi examinado em laboratório. Os resultados indicaram que as incisões eram reais e não provocavam dor nos pacientes. Não foi encontrado nenhum sinal de infecção até três dias depois da cirurgia e exames evidenciaram que os tecidos extraídos eram compatíveis com o local de origem. Mas, funcionou? A conclusão, apresentada no relatório da equipe, afirma que “as cirurgias são reais, mas aparentemente não teriam efeito específico na cura dos pacientes”.
A verdade é que a ciência ainda sabe muito pouco sobre o tema. “Nossos métodos de avaliação não são suficientes para comprovar o resultado desses procedimentos cientificamente”, afirma Roberto Luiz D’Ávila. “Do ponto de vista científico, questiono se aquilo pode trazer a cura. Mas, com trinta anos de profissão, acredito que – desde que não abandonem o tratamento tradicional – todos os pacientes têm o direito de acreditar naquilo que possa lhes trazer paz, tranqüilidade e, principalmente, esperança.”
"Tomava quilos de antidepressivos e bati
Um comentário:
Sugestão hipnótica com auxílio da fé e fragilidade emocional do indivíduo.
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